#3
O comboio nocturno de Paris para Roma foi a nossa introdução a compartimentos que, durante vinte e dois dias, quase se tornaram família. Com seis lugares, uma janela e uma porta de vidro com cortinados escuros para proporcionar uma boa noite descanso, cada compartimento destes comboios pode ser transformado num quarto com seis camas através da engenhosa arte de alavancas e força bruta. Partilhamos os lugares com uma francesa pouco faladora e um casal de sul-coreanos que amavam o Cristiano Ronaldo e tinham uma aversão especial pelo Humberto Coelho. Convém dizer que, na sua maioria, sempre que dizemos que somos de Portugal a conversa recai inevitavelmente sobre futebol. Não é mau, porque é sempre um bom início de conversa, mas podíamos ter arranjado algo melhor como estandarte do nosso país.
Em contraste com a chuva torrencial de Paris, Roma apresentou-nos um calor abrasador, por vezes insuportável, que com a ajuda da zona não muito agradável do nosso quarto, cheia de chineses e prédios degradados, me provocou uma cara desgostosa durante a primeira hora na cidade. No entanto, a mente do Turista Parvo rapidamente se habitua aos loucos condutores romanos (sim, não é mito, eles não usam semáforos, eles não param na passadeira, mesmo que vocês já estejam no meio da estrada, a lamber docemente um super mega ri-fixe gelado romano), às enormes ruas, aos belos prédios creme, às bonitas romanas, às piaggio do povo e aos alfa-romeu dos carabineri, aos fiat 500 e a todos os monumentos absurdamente arrasadores que se podem ver.
Vi o Coliseu. Toquei nas paredes do Coliseu, onde homens lutavam com homens, animais com animais, homens com animais, onde o César decidia, onde os Romanos vibravam. Todo o anfiteatro está em ruínas, mas é inacreditável como há dois mil anos alguém construiu aquilo, e como vinte séculos depois a estrutura, as bancadas, as galerias, os subterrâneos, os arcos, as inscrições e toda uma energia contagiante continuam de pé. Mas Roma não é só o Coliseu, porque basta voltarmos costas para o grande símbolo da antiguidade para nos depararmos com algo que eu não sonhava existir. A Roma antiga existiu mesmo, e é essa Roma antiga que podemos ver espalhada por todo o Fórum Romano, com os imensos templos, arcos, basílicas e toda uma infinidade de locais de comércio que nos deixam desesperados por não termos vivido naquela altura. Por causa dos incêndios, das cheias, das pilhagens, e de dois mil anos de chuva, vento e seres humanos, todos os monumentos estão em ruínas, mas acreditem quando digo, é avassalador.
E há mais, cada sítio com pano para mangas para eu me derreter perante quem me lê, passando pelo desmedido palácio do César, as inúmeras de fontes de mármore branco, com água mineral límpida que nos chamam para beber a cada virar de esquina, ou o panteão com uma enorme cúpula aberta que deixa entrar a chuva se é que esta alguma vez cai em Roma.
Tivemos um jantar iluminado pelo Tibre, imensos e deliciosos gelados, uma noite de calor insuportável que me deixou a dormir dentro do frigo-bar e, antes da partida para Florença, uma visita por todo o Vaticano que, apesar de agnóstico, me deixou totalmente surpreso pela sua beleza. Dá também que pensar sobre a quantidade astronómica de dinheiro que a igreja tem e o que faz com ela, mas isto já são histórias para outro sítio.
Dois mil e quinhentos anos de história são-nos apresentados através de impérios, vitórias, devastações, incêndios, saques, contos bíblicos, renascença, neoclassicismo, loucura e invasões de turistas desesperados por absorver num curto espaço de tempo toda a história monumental da Cidade Eterna. Este é um destino a ver de mente relaxado, sob pena de não se aproveitar devidamente tudo o que Roma nos tem para dar. Apesar de ter ficado aterrado com a impressão inicial da cidade, em muito semelhante a uma Lisboa mais decadente, Roma entrou em mim para daqui nunca mais sair.
4 Comments:
Estou mesmo a imaginar-te a cantar "guiado pela mao, com jesus eu vou...." nessa visita ao vaticano =P
Beijooo*
E descreveres a experiência com menos entusiasmo??
Depois és tu que convences a minha mãe a dar-me dinheiro para andar a conhecer o resto da Europa!
Sì, sicuramente la più bella città del Mondo!!! Ler este post fez-me regredir um ano... Amanhã estaria eu a embarcar no avião, rumo à cidade eterna. O melhor que te posso desejar é que o teu Erasmus seja tão inesquecível como foi o meu.
E continua a ser delicioso ler as coisas que tu escreves. 6 meses em Roma e não a teria descrito tão bem como tu o fizeste!
Tanti baci*
Eh incrivel como cada esquina de Roma parece ser uma obra de arte unica e inigualavel...
Continua a sorrir cada vez que me lembro dos lugares que ai visitei...
Especialmente a Fontana di Trevi...
Cheguei la e fiquei 1 hora deslumbrado com aquela obra de agua e pedra (e moedas... muitas!!!)
Obrigado pela viagem =)
Atiraste as duas moedas?
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