#14

Viena, 6 e 7 de Setembro de 2007

Esta viagem Budapeste-Viena está a mostrar-se encantadora. Apesar das nuvens, por onde o sol se decidiu mostrar por breves segundos, a paisagem verde-oregãos, o livro de Michael Chabom que estou a ler e se está a revelar uma agradável surpresa e a música que me chega aos ouvidos de forma deliciosamente aleatória, estão a fazer com que o meu estado de espírito seja de simples deleite. Ao mesmo tempo, penso como gosto do miúdo, que ainda não nasceu. É um sentimento estranho. Bem, vamos desfrutar a viagem. Até já.



Terminada uma viagem de três horas num comboio alemão impecável, encontramos uma Viena chuvosa. No entanto, esta cidade deslumbra pela quantidade de verde em todas as ruas, pelas pessoas que apesar de serem imensas vagueiam calma e distraidamente pela cidade, formando, em conjunto com a espantosa arquitectura, uma atmosfera descontraída, clássica e triunfal que, sem pressas, se apodera involuntariamente de nós.



Depois de ir atrelado à Ana numa visita ao museu da Imperatiz Elisabete, refugiamo-nos da chuva dentro do Tram circular que passa pelos pontos fortes da capital austríaca. Uma, duas, três voltas. Decididamente não queríamos sair de dentro do confortável eléctrico. Pela noite, um concerto memorável com composições de Strauss e Mozart, onde cinco cantores de ópera causavam calafrios a cada palavra que debitavam, ao mesmo tempo que as nossas mentes subiam aos píncaros. Indescritível.



No dia seguinte, fugindo a chuva, outro museu, este mais a meu gosto, a KunstHausWien. Uma longa viagem feita à chuva até ao distante museu, mas nitidamente vantajosa. Friedensreich Hundertwasser, pintor, escultor, arquitecto, uma mente fantástica. Com o seu discurso e acção anti-racionalista, Hunderwasser criou obras arquitectónicas fantásticas, a fazer lembrar uma fusão entre as obras de Gaudi e as de Tim Burton. A sua linha filosófica abominava tudo o que fosse abjecto à natureza, linhas rectas, destruição, construção que não fosse feita em conformidade com a coerência natural das coisas. Devolver à natureza tudo o que ela nos dá a nós. Utópico, mas bom.



Não gosto de descrever pensamentos de outros, primeiro porque não os sei tão bem como devia e depois porque nunca vou conseguir dizer o mesmo, sem me remeter à cópia. Por isso, por favor, se forem a Viena, visitem este museu, apaixonem-se por cada quadro, cada ideia, cada frase inscrita nas paredes. O chão não é plano mas sim construído em ondas, porque o chão plano é uma falsidade criada pelo homem. No entanto, se algum de vocês se sentir tonto à medida que percorrem os três pisos do museu de Hunderwasser, podem ter a certeza que a tontura não teve origem no chão, mas sim na quantidade de ideias monumentalmente simples que um só homem concebia dentro de si.



Mas nem só da KunstHausWien se fez este dia. Depois de um jantar tipicamente Austriaco, servido por uma bruta mas sorridente empregada, veio a chuva. Depois da chuva veio a visita curta, e um pouco entediante a um museu de Freud que se limita a mostrar uma biografia fotográfica completamente inútil para quem procura aprender um pouco que seja sobre o seu trabalho. Depois do museu do Freud um simpático café de uma senhora francesa, ternamente decorado do qual não nos apetecia sair. E depois, o Papa.



Pelos cartazes nas ruas, onde o Papa Bento (ou aquela criatura simpática do Star Wars) aparecia abraçado a todas as crianças que tinha a sua volta, já tínhamos compreendido que Sua Santidade Estelar estava por terras de Heidi. Depois de questionarmos um repórter fotográfico sobre o paradeiro do Papa, percorremos os jardins do palácio em busca do sítio por onde o Quase Jesus iria estar. Uma multidão aguardava. Gente de todas as idades, jovens envergando camisolas do Papa Bento, vendendo DVDs, senhoras de terço na mão, dois portugueses excitados por, perdido o Papa em Roma, o encontrarem em Viena. Ouvem-se helicópteros, penso que o Papa vai saltar de um deles a qualquer momento. Falso alarme.



Polícias amontoam-se à nossa frente, no gradeamento. Militares preenchem os telhados, de binóculos nos olhos, como procurando meninas austríacas em trajes menores dentro das janelas do palácio. Uma limusina, outra limusina, gente de fato, muita gente de fato. De repente, um carro branco com uma pequena bandeira do Vaticano em cada extremo do capo aproxima-se, a nossa câmara começa a filmar, eu começo a cantar que estou guiado pela mão com o Jesus eu vou, e sigo como ovelha que encontra o pastor. Mas quem segue é o carro, para dentro do edifício. Do Papa, apenas uma pequena cabeça, mais nada. O Papa não nos bateu as palmas. O Papa não ama a Jesus. Fica a recordação e muitas gargalhadas divinas. Vi a cabeça do Papa a vinte metros de mim.



À noite, decidi meter conversa com o fantástico casal Norte Americanos de S. Francisco que connosco partilhava o quarto e com os sempre simpáticos recepcionistas Australianos. É extraordinário como me sinto pequeno, tacanho, de cada vez que falo com gente como estes quatro aventureiros, que cansados de estar no seu país, decidiram largar tudo, uns para trabalharem na Republica Checa e outros para percorrerem o mundo trabalhando em estâncias de ski, pousadas e tudo mais. Gostava de ter coragem para fazer o mesmo. E como me disse o Leo, são mais que muitas as pessoas que dizem que “Gostavam”, que “Queriam”, parem de dizer e façam! Pois bem.



Para o resto da noite, seguimos para uma feira popular fantasma, algo assustadora, na periferia da cidade, desapontados, seguimos para o centro onde descobrimos uma outra Viena, com mais vida, mais energia, igualmente deslumbrante.



Foi uma estadia fantástica numa cidade que vou tentar visitar novamente no inverno, quando a neve a pintar de cores mais meigas. Não é mito, ou colorido de quem conta, Viena é mesmo uma cidade atraente, pacífica mas magnifica. Não fazia parte dos meus planos visitar as três últimas cidades deste Interrail, pensei que não havia tempo. Fico contente que o tenha feito. Agora, sim, finalmente, venha Praga, a aventura de vinte e dois dias pelo velho continente, de mochila com calças que fazem as senhoras de idade benzerem-se três vezes, com três t-shirts, três meias, três boxers e três milhões de recordações está mesmo a terminar!

2 Comments:

Blogger Helena Borges said...

Tu nao gostas de mim mas eu gosto da primeira foto deste post =)

E agr que as aventuras do inter-rail estao quase no fim...ainda tens mt que contar =) Essas aventuras na Alemanha têm de ser tao bem descritas cm as do inter-rail =D

October 7, 2007 at 1:19 AM  
Anonymous Anonymous said...

Onde é que nós estamos? NO PARAíSo! No paraíso do quê?? DO ROCK! :)

Faltas tu... saudades... beijo bom

October 7, 2007 at 11:24 PM  

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