#18

Nürnberg, 14 de Outubro de 2007

Acordar bem cedo, por volta das sete e meia da manhã, com as amigas do meu vizinho chinês a tocarem a sétima sinfonia de Beethoven com a minha áspera campainha. Voltar a adormecer e acordar mais tarde, com vontade de conhecer mais um pouquinho do meu pequeno novo mundo. Erguer-me, pôr o novo dos Radiohead a tocar, espreguiçar-me convenientemente e saltar para o chuveiro. Ainda não está muito bem lavado, branquinho e apetecível, mas vai ter de servir. Banho tomado, tiro com os olhos ainda meios fechados as primeiras peças de roupa que os meus dedos farejam. Subo a persiana, num ritual que lembra o içar da bandeira, graças ao fantástico cortinado patriótico que improvisei. Tomo um horrível e revigorante café instantâneo – será que uma colher de sopa por chávena me fará um mal desconhecido? – digo bom dia ao Chinês que só fala Alemão, pego nas chaves, carteira, telemóvel, máquina fotográfica, dicionário de bolso e o meu «One Flew Over The Cuckoo’s Nest» escrito num inglês por vezes labiríntico, atiro com tudo para dentro da minha mala e ala que se faz tarde para a Rua, que um ERASMUS não se quer enfiado em casa.



Lentamente, absorvendo cada pedaço de madeira, betão, perfume ou monóxido de carbono que esta cidade tem para me dar, percorro o caminho de sempre até ao centro da cidade. Perco-me em ruas ainda desconhecidas, descubro a Red Light District ou o pequeno mercado de Antiguidades, sou parado por duas belas alemãs que procuram um saca-rolhas mas que me encontraram a mim. É cedo, mas já estão num mundo de fadas, duendes e castelos encantados, acompanhadas por cinco garrafas de diferentes tipos de cerveja, Prosecco, pãezinhos e bolachas. Encontraram o príncipe encantado, e esta ein? Perdemo-nos na conversa junto a uma das mágicas ilhas deste Pegnitz que tanto me apaixona, dizem-me que querem ir a Portugal, que não gostam dos Alemães, que gostam de mim, que têm os namorados à espera, ó não, agora eles estão a ver-te, vão ficar com ciúmes, não faz mal eu corro mais depressa, risos, não queres vir connosco, não, divirtam-se, merda que a máquina esta sem bateria, bom tenham juízo, quatro beijos, está bem mais outro, adeus.



Sento-me no Starbucks a digerir a estranha sequência de acontecimentos de hoje, todos os dias algo diferente. Pego no meio livro, sorvo a amargura do café, tento entender o que as três alemãs ao meu lado dizem, sorrio-lhes e elas, filhas da sua terra, coram e sorriem de volta, comentam qualquer coisa codificada em germânico e continuam com as suas vidas. Feita a leitura, a tentação e o deleite, subo a Konigstraße por entre as grandes tendas listadas como os irmãos White, onde os vendedores exibem com orgulho uma quantidade imensa de fruta, queijos, enchidos e até uma mostra considerável de azeitonas e produtos mediterrânicos.



Volto para casa para vos escrever, dar uma vista de olhos pelos jornais Portugueses, tentar falar com quem aparece na minha pequena janela com vista para Casa, cozinhar algo saboroso com o tão português casamento de alho e azeite, degustar o pitéu antes de convidar alguém novo para um copo de vinho e dois dedos de conversa, pôr algum perfume porque as pessoas se querem cheirosas, apagar as grandes velas que me iluminam o espírito noctívago e preparar-me para mais uma noite de borga hiperactiva.



Desde que cheguei, devo ter passado quatro ou cinco noites em casa. Todos os dias algo diferente, alguém novo para conhecer, uma nova forma de fazer rir, cantar por todos os poros que for possível. Os dias passam assim, rápidos como setas que tento parar com as trémulas mãos. Não quero que isto acabe. Pára seta, pára!

3 Comments:

Blogger Xika said...

ah starbucks starbucks
ahhhhhhhhh bebe um capuccino grande em copo de papel por mim..
andar pela rua a beber é tao bommmmmmmm com o vento frio na cara!

October 15, 2007 at 2:50 AM  
Blogger Lua said...

"Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada pra andar.

Enquanto houver ventos e mar
a gente nao vai parar!
Enquanto houver ventos e mar..."

Jorge Palma

sonzinho portugues pa matar as saudades...

Beijo gd, narigudo;)

October 15, 2007 at 8:07 PM  
Blogger the girl in the other room said...

Sonho aqui, nas tuas palavras. Sonho com os teus sitios, nas tuas fotografias.

Saudade*

October 16, 2007 at 1:23 PM  

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